JIPE
Postado por Rilvan Batista de Santana 16/02/16
Jipe
R. Santana
“Quero a certeza dos loucos que
brilham. Pois se o louco persistir na sua loucura, acabará sábio” (Raul Seixas)
Pense nesta
história, caro leitor: se o prefeito de uma cidade resolvesse homenagear a
figura mais popular de sua cidade e propusesse erigir estátua na praça, o faria
com base nos feitos do homenageado e no reconhecimento da comunidade, mas se os
feitos do homenageado não passassem de loucas e excêntricas manifestações, que
o homenageado fosse conhecido pelo apelido e não pelo nome de batismo, será que
o prefeito teria sucesso nesse pleito? Claro que não! Mas, se o homenageado fosse
Afrânio Batista Queiroz, maluco beleza itabunense, carinhosamente apelidado de
Jipe, claro que sim! Pois Jipe é a figura folclórica mais popular de Itabuna e
quem mais povoou o imaginário lúdico da criança daquela época, além de obter a
compreensão do adulto de seu tempo.
Não se sabe até
onde é lenda e até onde é fato: conta-se que Afrânio, jovem, pediu ao pai um
Jeep Willys de presente, o velho prometeu, mas não lhe deu, ignora-se o motivo
do descumprimento paterno, contudo, foi a gota d´água para o distúrbio mental
de Jipe. Daí em diante, ele proveu-se de apetrechos (rádio de pilha, lanterna,
retrovisores, antena, buzina, volante, caixa às costas, etc.), e, tornou-se um
homem-carro.
Com fôlego de
maratonista, Jipe percorria com seu “Jeep” imaginário, cidades circunvizinhas
de Itabuna, algumas com distância acima de 20 Km. Com uma caixa cheia de
apetrechos às costas, antena balançando da esquerda pra direita, pra cima e pra
baixo, rádio de pilha ligado em alguma FM ou AM, retrovisores laterais, volante
para manobrar o “carro”, lanterna, jipe é alegria da molecada aonde vai. Quando
chegava à cidade, percorria a rua principal, fazia demonstrações de baliza na
praça, parava quando alguém lhe oferecia combustível (água) – não tomava bebida
alcóolica, fiel às leis de trânsito.
A molecada fazia
uma festa quando Afrânio saía da cidade com o seu “Jeep”. Os moleques
acompanhavam Jipe com tampa (volante) de panela nas mãos, numa imitação
hilariante, assim, eles divertiam-se e divertiam a todos.
Suas aptidões de chofer
deixaram marcas na Avenida Cinquentenário, Jipe acompanhava os automóveis com
pensamento criativo nas manobras que deixavam as pessoas embasbacadas, se ia
estacionar entre 2 carros, ele fazia o movimento de baliza com precisão de um
piloto de Fórmula-1: colocava o seu “Jeep” à altura do retrovisor do
carro estacionado, dava uma ré em diagonal, ia pra frente e pra trás no limite
da vaga, puxava a “trava” de mão, dava-se por satisfeito.
Jipe era um louco
talentoso, inteligente, instinto aguçado, criativo, feliz em seu mundo
imaginário, nunca fez o mal, alma pura, recolhido em sua ideia obsessiva,
perseguiu o objeto do desejo e o alcançou não do modo normal, concreto, mas do
modo imaginário, no mundo das ideias, lugar que somente os loucos têm acesso, lugar
que tudo é possível, lugar onde não há censura, não há proibição, lugar em que
o superego não decide e onde a fantasia é real.
O homem desde o
princípio do mundo investiga a mente humana, mas pouco evoluiu até agora,
fisiologicamente tem havido avanço, no entanto, existe ainda muito mistério. Há
um adágio popular que cada “doido tem sua mania”, o que é verdade, aí se
justifica o estereótipo de Afrânio Batista Queiroz.
O modelo “Jeep”
1918 bateu o motor em 2010 e Jipe foi morar no céu e parodiando os versos do
poeta desconhecido, o destino de Jipe é viajar... Viajar na rua, na estradada,
na luz, no ar, nas estrelas, nos cometas, nos planetas, porque o signo de Jipe
é viajar, sempre aprender viajar... Jipe, o audaz, Jipe, o incansável, Jipe, o
maratonista, Jipe, o homem-carro... Seu destino é viajar, sempre viajar,
viajar, viajar, viajar...
Autor: Rilvan Batista de Santana
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